terça-feira, 23 de agosto de 2011

o tempo havia passado, os vestígios daquele amor não estava mais ali. a memória daqueles que se foram é uma atitude de solidariedade. ou seria de amor? alguns defendem ser tudo a mesma coisa. e eu não havia visto o mar. nunca o tinha visto. e de repente ele se apresentava, imponente, a mim. maravilhava-me. deixar que ele me leve. certa vez, então, o acusei de ter-me roubado a esperança. caminhei longo tempo na praia, pensando que a teria de volta. mas só assim entendi que o mar não devolve, nunca, o que nele se perdeu. ladrão ele não era. mas sua bondade estava além de minha compreensão. é estranho que daqui se fale do mar. daqui que o mar não vejo. daqui que se permite até dizer: "não há mar, o mar não existe". a memória porém, a mesma memória que nos traz os mortos, essa memória nos devolve o passado. ela nos dá quase tudo, menos a esperança perdida. o último setembro que passei em montes claros, em vez de primavera veio a tempestade. em vez de flores, espalhou-se pela manhã o cheiro melancólico da estranheza da vida. mas o tempo que está sempre passando, o tempo, esse que corta caminho por fora da temporalidade, certamente deve nos ter algo a dizer. não há quem o impeça de marchar com astúcia, em uma apoteose plena. mas há quem não queira vê-lo passar, e muito menos passar junto a ele, dentro dele. ainda tenho medo do mar. ainda o mar esconde algo de mim. tento adiar, mas nele precisarei adentrar e descobrir, talvez quem sabe, a esperança perdida. enquanto isso, refugiar-me-ei nas montanhas estáticas, sentindo o vento como se fosse a maresia. e das montanhas de minas, observo o mar e tenho medo do que nele hei de encontrar em mim.